segunda-feira, 27 de junho de 2011

A Rosa Antieuclidiana

Escrevi esse textinho para o jornal do grupo que faço parte na PUC/SP, a Construção Coletiva. Resolvi compartilhá-lo aqui, pois acho que esses parágrafos são uma boa apresentação do grupo para quem não conhece. Também pensei que colocar esse texto aqui é uma forma de preservá-lo, para que eu mesmo não termine perdendo-o. Em alguns momentos pode parecer um pouco piegas, mas acredito que essa apresentação é uma boa síntese das concepções políticas que defendo para a organização do movimento estudantil de forma geral. Segue o texto.      

A Rosa Antieuclidiana
                                                                                          
 “Os tiranos quanto mais pilham mais exigem, quanto mais arruínam e destroem, mais se lhes dá, quanto mais são servidos, mais se fortalecem, e se tornam cada vez mais fortes e dispostos a tudo aniquilar e destruir; e se nada lhes dá, se não se lhes obedece, sem lutar, sem golpear, ficam nus e desfeitos, e não são mais nada, como o galho se torna seco e morto quando a raiz não tem mais humor ou alimento”
(La Boétie)  

“Posso não mudar sua opinião, mas espero ao menos causar inquietação” (Dostoievski) 

            Nessa primeira edição de nosso jornal – esperamos que primeira de muitas – começamos, educadamente pela nossa apresentação aos que ainda não nos conhecem. Prazer, somos o Grupo Construção Coletiva. Ao invés de fazer uma apresentação formal (e chata) do nosso coletivo vamos inverter um pouco a ordem das coisas e falar primeiro, em poucas palavras, sobre a PUC/SP e sobre o que entendemos por universidade.
            A nossa PUC tem uma curiosa fama de universidade democrática. Apresar dessa fama é com grande pesar que constatamos hoje que a democracia na PUC já não passa de uma página virada no livro de sua história. Desde a intervenção promovida pela Igreja Católica no ano de 2006, a criatividade puquiana tem sido substituídas pelo obscurantismo e mediocridade. No corrente ano de 2011 parece que chegamos próximos da completude desse projeto, a “ditadura da igreja”, que até então se mostrava de forma envergonhada, perdeu o pudor e agora exibe a que veio da forma mais escancarada possível.
            Diante das últimas ações do CONSAD (Conselho administrativo composto pelo Reitor e dois Padres da Fundação São Paulo) parece ter ficado claro que todos os demais conselhos da universidade e das faculdades nunca passaram de mera encenação de uma democracia já assassinada. O mais frustrante de tudo isso é que esses senhores do clero nem mesmo possuem qualquer poder de Direito; suas últimas “ordens” são eficazes puramente por que geram obediência da acuada comunidade puquiana, mas não encontram qualquer amparo no corpo normativo interno da universidade ou no ordenamento jurídico pátrio
            É impossível dissociar tanto o formato quanto a qualidade do nosso curso de Direito dessa estrutura autoritária imposta à PUC. Diante então da naturalização desse “estado de exceção” nas instituições outrora democráticas da PUC, não é de se estranhar que, no âmbito acadêmico, a inovação ceda lugar a repetição, que a crítica seja substituída pela pura doutrina dogmática, que o saber seja esmagado pela técnica e que a liberdade de pensar, de produzir conhecimento seja tolhida pela disciplina que impõe o pensamento único.
            Além disso, esse processo pelo qual passa a PUC, implica em uma ferrenha desvalorização de todos os espaços fora da sala de aula. Temos que lembrar que no espaço além das aulas não existem apenas rampas e lanchonetes. São nos momentos extra-aula que se entra em contato com a diversidade do mundo universitário, é onde os sujeitos se identificam e se expressam em suas liberdades, é onde se produz a pesquisa, é onde se cria a extensão para levar a universidade para além de seus muros, é, em síntese, onde se constrói o que a universidade tem de diferente e de maior potencialidade. O pior disso, é que ao desvalorizar toda essa diversidade, se finda por assassinar a própria aula, que inevitavelmente se torna monótona, repetitiva e puramente doutrinária. 
            É diante de tudo isso que acredito poder explicar quem somos. Somos fundamentalmente inconformados. Unidos por um sentimento comum de inquietação, não dispostos a passividade e incapazes de ver aporia no mundo. Insistimos em brotar do asfalto! Acreditamos que é a união dos descontentes que pode produzir algum contentamento. Organizamo-nos em grupo para produzir nossa identidade por meio da convivência de pluralidades. Certamente não carregamos conosco a verdade, não temos as soluções e nem conhecemos o caminho a seguir. Apenas acreditamos que sozinhos não se pode encontrar nenhuma verdade, não se chega a qualquer solução e nem se tem fôlego para percorrer qualquer caminho.
            Negamos a delegação de responsabilidade política para um representante, por que temos a convicção de que por mais que ninguém seja imprescindível para o transcorrer do processo histórico, tod@s são insubstituíveis e tem contribuições singulares para transformar a realidade do mundo.
            Por fim, não pretendemos impor uma opinião, nos recusamos a inverter a lógica da doutrinação para nossos ideais, mas esperamos ao menos causar inquietação. Desse ponto não desistiremos, partimos sempre da idéia mínima em comum de que há algo muito errado na PUC. Se na tentativa de transformá-la iremos ou não obter êxito não é o fundamental.  Não guiamos nossa atuação pautada pelo ideal de eficiência. O atuar político não pode se curvar a essa forma de censura. Aquilo que nos motiva é o simples imperativo de que não conseguimos ficar calados diante de nossas indignações. Sendo assim, é melhor qualquer derrota em batalha do que a capitulação.
            Esperamos que vocês não tenham medo de sentir a mesma inquietação que nós, que não permitam que a escuridão da PUC encolha seu espírito e nem acreditem em quem afirma possuir a luz – vale lembrar que não é apenas a escuridão que cega.
            Acreditamos que tudo que temos a oferecer é uma idéia, idéia de fazer política enquanto sujeitos livres e que encontram um no outro a inspiração e coragem para lutar pelo que parece impossível. Lutar para que as próprias barreiras do possível sejam alargadas fazendo do impensável realidade.            
            Prazer, somos a Construção Coletiva, vocês podem sempre encontrar um dos rosinhas nos corredores ansioso para conversar e para construir com todos que estiverem dispostos, sintam-se convidados para aparecer em todas as nossas reuniões. Peço, por fim, que não se espantem com nossa cor, o rosa é fundamentalmente para lembrar que ainda há cores na PUC além do cinza, e como já dissemos, insistiremos em brotar do asfalto, por que ainda que pisoteiem todas as rosas, ninguém pode deter a primavera!

“Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens macias avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.”
(Drummond)

Para aqueles que se interessarem, a Construção Coletiva está organizando agora no mês de julho um pequeno curso de formação política. Veja aqui quando serão as reuniões e os temas em cada dia.


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Ivan Sampaio

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